Saiba por que ainda vale a pena escolher os depósitos tradicionais

Comparámos os novos produtos estruturados com os tradicionais depósitos e avaliámos os benefícios e desvantagens.

Os depósitos estão hoje na moda. Mas nem todos os depósitos estão ‘in'. É o que se passa com os depósitos duais ou indexados, conhecidos também como produtos estruturados. Este tipo de depósitos caracteriza-se pelo facto de a sua remuneração estar indexada à evolução de outros instrumentos financeiros, como acções, moedas e matérias-primas, por exemplo. Para os investidores estas aplicações têm, à partida, uma grande vantagem: é uma forma de ganhar exposição às subidas potenciais de activos com maior risco, tendo a certeza de que não perdem o capital investido. Mas, como em tudo na vida, também nos depósitos não há "almoços grátis". O Diário Económico analisou os prospectos dos cinco depósitos duais e indexados lançados pela banca neste último trimestre, e que estão publicados no Portal do Cliente Bancário. Da análise é possível verificar que, não só estes produtos apresentam várias desvantagens face aos depósitos tradicionais, como a rendibilidade apresentada é, em alguns casos, inferior à praticada neste momento pelos melhores depósitos tradicionais do mercado. Em resumo: não compensam.

A primeira grande desvantagem tem a ver com o facto de a maioria dos depósitos duais não permitir o resgate do dinheiro aplicado antes da data de vencimento da aplicação. Isto verificou-se em quatro dos cinco depósitos duais analisados. Sendo que alguns dos produtos têm um horizonte temporal alargado- chegando a atingir os três anos. Ou seja, o investidor durante este período não poderá mexer no dinheiro investimento. Só este facto retira aos depósitos duais uma das características mais atractivas dos comuns depósitos, que é a sua elevada liquidez.

Mas as desvantagens não ficam por aqui. A rentabilidade dos produtos duais e indexados, na maioria dos casos, não é calculada de forma simples. Normalmente socorrem-se de fórmulas de cálculo complexas, com muitas variáveis, que tornam difícil ao investidor perceber como é gerada a rentabilidade do produto. Um desses exemplos é o depósito indexado "Rendimento Mais USD" do Santander Totta- um depósito que tem como activos subjacentes um cabaz de cinco acções e o índice S&P 500. "Na data de vencimento haverá lugar ao pagamento de um juro único, de valor correspondente a 50% da diferença entre a rendibilidade média do cabaz de acções e a rendibilidade média do índice de acções". Confuso? É natural. Ainda assim, há que salientar como ponto positivo o facto de o Santander Totta apresentar três simulações de rendibilidade do produto para simplificar e ajudar a clarificar o investidor de como é que a rendibilidade desta aplicação é gerada.

Já o prospecto do "Barclays Valor Azul- Série II" não é totalmente claro. Este depósito é, na realidade, um conjunto de quatro depósitos com datas de vencimento a três, a seis, a nove e a 12 meses. O montante investido será repartido em quatro tranches pelos diferentes prazos que estarão sujeitas a uma TANB igual: 4%. À partida, um investidor pensaria que a remuneração global deste produto ao fim de 12 meses seria de 4%. Mas não é. Porque, neste caso, a soma das partes não é igual ao todo. Ou seja, o facto de serem taxas anuais semelhantes aplicadas para prazos diferentes, faz encolher o retorno da aplicação. Assim, 1.000 euros investidos neste produto do Barclays, ao final de 12 meses renderiam apenas 25 euros brutos. Um valor que compararia com os 40 euros brutos que o mesmo investidor ganharia se aplicasse os mesmos 1.000 euros num depósito tradicional a 12 meses com uma TANB de 4%. Este exemplo mostra como os cuidados e a atenção dos investidores devem ser redobrados quando analisam um prospecto de um depósito dual. Tudo para que as expectativas dos investidores não saiam goradas.

Outra desvantagem dos produtos estruturados tem exactamente a ver com as expectativas de rentabilidades que são apresentadas aos investidores. Muitos destes produtos garantem uma taxa mínima de rendibilidade (que é normalmente muito baixa) e divulgam também a rentabilidade máxima que é possível obter- e que normalmente é bastante elevada e atractiva. Mas, mais uma vez, os investidores devem ter cuidados redobrados quando olham para estas rentabilidades generosas. Isto porque para o investidor beneficiar destes ganhos máximos tem que ser cumprida uma série de condições e requisitos muito difíceis de atingir. Ou seja, é preciso que os mercados, os astros e as constelações estejam devidamente alinhados para que seja possível alcançar a rendibilidade máxima publicitada pelos produtos. Por exemplo, no caso, do depósito indexado" Rendimento Euro Sectores" do Santander, este produto de três anos prevê uma TANB máxima de 9,854%. No entanto, para conseguir obter esta taxa de juro é preciso esperar que os três índices de acções sectoriais que estão subjacentes ao depósito valorizem em média 60% nos próximos três anos. Uma possibilidade altamente imprevisível de determinar tendo em conta a elevada instabilidade que os mercados vivem actualmente.

Um estudo da CMVM de Fevereiro de 2010, sobre os produtos financeiros complexos alertava já para essa mesma realidade. "Constatou-se que os cenários de elevadas rendibilidades tinham uma probabilidade de ocorrência bastante reduzida", referia o estudo. A mesma publicação adiantava ainda que em muitos dos produtos estruturados havia uma elevada probabilidade de os investidores receberem apenas a remuneração mínima. No entanto, alguns produtos como o caso do "Cabaz Top Player" do BiG, não têm uma remuneração mínima. Isto significa que o investidor pode não receber qualquer remuneração pelo dinheiro ali aplicado durante dois anos.

Todas estas desvantagens tornam os depósitos duais pouco atractivos face aos depósitos tradicionais. Um sentimento que é ainda mais acentuado pelo facto da banca estar a remunerar com taxas bastante atractivas os tradicionais depósitos a prazo. Recorde-se que actualmente as melhores taxas de juro nos depósitos a prazo tradicionais variam entre os 4% e os 6% (TANB), consoante o prazo. São taxas fixas e garantidas, independentemente da evolução dos mercados. ....


Produtos estruturados à lupa

Depósito Indexado "Rendimento Euro Sectores"
A remuneração deste depósito está indexada a três índices accionistas sectoriais europeus. A saber: o Eurostoxx Telecommunications; o EuroStoxx Oil & Gas e o Stoxx Europe 600 Basic Resources. A rentabilidade atribuída aos investidores neste produto corresponderá a 50% da rentabilidade média atingida pelo cabaz de índices nestes três anos. Sendo que essa rentabilidade acumulada nunca poderá ser superior a 30% (um valor que corresponde a uma TANB de 9,584%). Ou seja, num cenário positivo em que os índices valorizem, em média, nos próximos três anos cerca de 25%, os investidores receberão um juro que corresponde a metade desta valorização (12,5% no acumulado dos três anos, o que corresponderá a uma TANB próxima dos 4%). O problema é que - apesar de ser consensual entre os especialistas que as acções europeias estão baratas- é extremamente difícil determinar se estes índices europeus terão boas performances nos próximos três anos. Se a evolução deste cabaz for negativa, o investidor tem direito a uma TANB de 1,478%. É de salientar, como nota positiva, o facto do prospecto do Santander apresentar vários cenários possíveis de rentabilidade do produto. Desta forma, o investidor tem uma ideia mais clara das expectativas que poderá contar com os ganhos obtidos na aplicação.

Depósito Barclays Valor Azul- Série II
Na verdade este não é um depósito, mas trata-se antes de um produto com quatro depósitos a diferentes prazos. Imagine que decide investir 1. 000 euros nesta aplicação, este montante dividido em quatro partes (de 250 euros cada uma) sendo que cada uma delas tem uma data de vencimento diferente: a três meses, a seis meses, a nove meses e a 12 meses. Cada uma destas tranches está sujeita a uma TANB de 4%. E é aqui que reside a "armadilha" deste depósito. Porque no final de um ano (quando todas as tranches vencerem) os 1.000 euros que investiu neste produto render-lhe-ão na realidade apenas 25 euros. Isto acontece, porque apesar das taxas de juro associadas serem aparentemente atractivas, como o montante aplicado está dividido em vários depósitos de curto prazo, a sua poupança crescerá pouco. Porque, por exemplo, uma TANB de 4% num depósito a três meses, significa na prática que a remuneração a remuneração oferecida corresponderá a 1% do montante depositado. Os ganhos seriam bem superiores caso, o investidor aplicasse os mesmos 1.000 euros, num depósito tradicional que oferecesse uma TANB de 4%, a 12 meses. Neste caso, os juros brutos de uma aplicação de 1.000 euros renderiam no final do prazo cerca de 40 euros. Quase o dobro do oferecido pelo Barclays.

 

Invest Telecomunicações
À semelhança de outros depósitos duais, esta aplicação do Banco Invest está também indexada a um cabaz de acções. Neste caso, os títulos escolhidos pertencem ao sector das telecomunicações. A saber: Deutsche Telekom, France Telecom e Telefonica. Apesar de se tratar de um depósito a 12 meses, ele poderá acabar logo no final do primeiro trimestre, caso as três acções apresentem cotações superiores às verificadas no início da constituição do depósito. Se assim for, o investidor receberá uma remuneração nesses três meses de 2,10% sobre o montante depositado (o que corresponderá a uma TANB de 8,217%). Caso tal não se verifique, o produto vai continuar por mais três meses. Mais uma vez, se as cotações das três acções escolhidas forem superiores às verificadas na data de constituição, o produto termina, havendo lugar a uma remuneração de 4,20% sobre o montante investido (TANB de 8,804%). Caso contrário avança por mais três meses. É assim até o fim do último trimestre. No final dos 12 meses, se as acções tiverem subido acima da cotação inicial, o depósito será remunerado a uma TANB de 9,073%. Caso as cotações dos títulos sejam inferiores, o juro anual bruto que o investidor beneficiará é de apenas 1,171%. Ou seja, para um investidor beneficiar da remuneração máxima é imperativo que as cotações dos três títulos sejam superiores às verificadas na data de constituição, mas é necessário também que isso aconteça apenas no último trimestre de vida do depósito.

 

Cabaz Top Player
A remuneração deste produto está ligada à performance de um cabaz de acções composto por quatro títulos. A saber: Portugal Telecom, E.On; Total e Sanofi. No final dos dois anos será pago um juro, que vai corresponder a 70% da performance média do cabaz de acções. Assim, por exemplo, se no espaço de dois anos, as quatro acções apresentarem um desempenho médio de 30%, o investidor obterá uma mais-valia acumulada de 21%, o que corresponde a taxa anual bruta aproximada dos 10%. Uma perspectiva que, à partida, parece aliciante. O problema é que a actual crise financeira tem pressionado fortemente as acções europeias. E enquanto não existir uma solução clara para a crise da dívida soberana, a maioria dos especialistas está cautelosa sobre a evolução das acções no curto/médio prazo. Na verdade, nos últimos 12 meses à data de inicio de comercialização deste produto (no final de Setembro/inicio de Outubro) este cabaz de acções tinha obtido uma rentabilidade média negativa em 18%. E não há garantias de que este desempenho negativo não se venha a repetir nos próximos anos. Se assim for, e o cenário mais pessimista se concretizar, o investidor no depósito Cabaz Top Player do BiG, chegará ao final dos dois anos de investimento e não terá direito a qualquer remuneração.

 

Depósito indexado "Rendimento Mais USD"
A designação de "produto financeiro" complexo é, sem dúvida, uma expressão que assenta como uma luva a este depósito em dólares do Totta. Isto porque o cálculo da rendibilidade obtida assenta numa série de variáveis, que têm de estar todas conjugadas na perfeição para que o investidor consiga obter a taxa anual bruta máxima de 6,898% (o que corresponde a um juro máximo acumulado de 21%). A remuneração está ligada a um conjunto de cinco acções norte-americanas (a Abbott Laboratories, a Apple, JP Morgan & Chase Co., a Coca-cola e a Wal-Mart). Mas não só. Além disso, o depósito do Totta tem também como instrumento subjacente a evolução do índice S&P 500. Sendo que a remuneração que o investidor irá receber corresponderá a 50% da diferença entre a rendibilidade média do cabaz de acções e a rendibilidade média do índice accionista verificada durante os três anos de vida do depósito. Ou seja, não interessa apenas que as quatro acções tenham um desempenho positivo neste período: é fundamental que a performance das acções seja superior à do índice S&P 500. Porque é dessa diferença que será calculada a rentabilidade. Caso contrário, investidor receberá apenas um juro bruto anual de 0,985%. Para se ter uma ideia, para um investidor ter acesso à remuneração máxima (6,898% de TANB) anunciada será necessário que as quatro acções referidas tenham uma performance média acumulada de 46% nos três anos, mas o S&P 500 só pode ter subido no mesmo período 4%. Ou seja, é suposto que as acções escolhidas tenham uma performance dez vezes superior à do índice. Uma meta que é muito difícil de atingir. Além disso, como é um depósito em dólares, o investidor corre o risco de no final do prazo, quando resgatar o dinheiro aplicado e fizer a conversão para euros ter um montante diferente daquele que investiu: pode ser superior ou inferior consoante a valorização ou desvalorização do dólar face ao euro.

fonte:http://economico.sapo.pt/

publicado por adm às 20:53 | comentar | favorito